foto de uma menina de 7 anos na birmânia, ela está vestida para seu casamento.

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segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

! Vamo tirar Jesus da cruz !




Antes de assistir a este vídeo acima eu já conhecia esta versão da música, composta por Pedro Luis e parceiros, através do álbum que Ney e Pedro gravaram, cujo vídeo acima é parte do Making Of . E sempre achei fantástica tanto a interpretação como a letra desta canção, e a letra em especial me leva a pensar sobre algumas coisas que percebo nos ambientes e tradições cristãos de meu país.

Essa música traz para o debate um tema que eu poderia referenciar com uma passagem bíblica "Não farás para ti imagem do Senhor, teu Deus". No momento desta passagem, Deus passa para Moisés a ordem para que seu povo não faça nenhuma pintura, escultura de qualquer coisa que habite abaixo da terra, sobre o céu ou debaixo das águas (Êxodo 4; 4).


É um momento forte da história da bíblia em que Deus fala diretamente na literatura. Esta passagem se tornou um dos argumentos para por em pé de guerra Cristãos Católicos ou Ortodoxos, que possuem imagens, contra Protestantes ou Muçulmanos, que não fazem imagens físicas de Deus.


Acho que meu objetivo aqui não é fazer um apologia das imagens de santos ou um ataque a tal prática. Quero sintonizar-me com a temática da música. Porque mesmo que não façamos imagem física de Deus ou outra entidade possível, um problema se coloca pra nós pelo fato de experimentarmos a realidade em grande parte pela visão, pelas imagens. E hoje, nos tempos modernos, a cultura tornou-se essencialmente uma cultura da imagem, imagem física, idealizada ou não.


A linguagem e a imagem em nossas vidas tem uma intimidade desafiadora para os estudiosos de hoje , mas que se revela uma chave para a compreensão da vida humana em sociedade. E é contra um tipo de linguagem utilizada para representar Jesus que está falando a música acima. Um tipo de linguagem que se revela no sentimento de culpa se propagando através da construção de uma "cultura da culpa", como fala Pedro Luis ao final do vídeo. - Não acredito que a linguagem seja toda a responsável por tal arranjo cultural, mas é uma trilha para observarmos o que mais há na formação deste modo de viver que é cultivado a tantos séculos.


Para algumas pessoas mais curiosas é um bocado estranho que Jesus seja repetidamente representado morto na cruz, ao passo, que somos levados a perceber que Deus é grandioso. Que segundo Paulo, a fé da cristandade seria vã se Jesus não tivesse ressuscitado. Estas pessoas se perguntam se não seria mais significativo, e coerente, representar Jesus em toda sua glória e beleza de amor, ressuscitado.


Acredito que aos poucos esta tradição está perdendo sua força por ação de grupos, como a renovação carismática na Igreja Católica, e outros que incentivam uma nova experiência das pessoas com Deus que tem reflexo nas novas representações de Jesus.


Falar se é correto ou não fazer imagens de Cristo ou de Deus ainda é muito delicado por estar ligado tradições muito antigas de grupos religiosos específicos. Assim, tornou-se inevitável para nossos antepassados tal prática que remonta hábitos pré-históricos da fusão da arte e da religião que se manifestam como expressões do íntimo da criatura humana.


Talvez por minha tradição cristã católica eu não veja maior problema em representar Jesus, Deus ou os santos. Os cristão católicos são constantemente criticados como pecadores e politeístas por algumas alas do protestantismo. Mas acho que até os protestantes, de uma forma ou de outra, materializada ou não, fazem suas imagens de Jesus ou de Deus. Já é possível ver filmes, teatros, desenhos animados das histórias da Bíblia e da vida de Jesus que foram feitos por equipes de profissionais e iniciativas protestantes; o teatro e o cinema são artes visuais, imagéticas. Acredito que até para os protestantes é inevitável ter para si imagens físicas de Cristo.

Passando a refletir mais diretamente o problema da criação das imagem de Jesus, ou de Deus, é preciso notar que a criação da imagem está anterior à sua materialização. Ou seja, se Cristo está morto nas esculturas ou pinturas, é porque insistimos em imaginá-lo assim. E mais, insistimos que essa imagem é mais significativa para o aprofundamento da re-ligação das pessoas com Jesus, que definiria a religião cristã em sua mais primitiva definição. E agora é preciso questionar porque nossas imagens "interiores" são a  de Jesus morto.

Nas comunidades católicas do Brasil, na sexta-feira da Semana Santa, é comum a prática da procissão do Senhor Morto que simboliza o momento em que Jesus é levado para o Calvário onde seria sepultado. Nesse ritual usa-se uma grande estátua de Jesus Cristo representado morto que é carregada em um andor pelas ruas ao passo que os fiéis são chamados a pedir perdão de seus pecados que levaram Jesus a deixar-se morrer para limpar-nos de tais impurezas. O clima é de luto, naturalmente. E na comunidade que faço parte também é costume segundo a concepção do padre que a dirige. Um dos padre que dirigiu minha comunidade, e que se tornou grande amigo meu, evitou esta prática e comentou para mim que uma vez uma senhora queria saber porque não fazíamos mais a cerimônia do Senhor Morto, a resposta foi simples, "porque Cristo vive, irmã". - A partir deste exemplo penso que, se pode haver algum problema com relação às imagens cristãs, esse problema está na forma como Deus se representa psicologicamente para as pessoas.


A imagem do Cristo morto não é a única imagem que acredito sofrer certas deturpações. Existe a imagem de Deus como um tirano, pronto para punir e ceifar a alma do pecado; a imagem do Deus que submete a mulher ao homem retirando-lhe a liberdade que Deus deu também a ela na criação, como se a punisse eternamente pelo pecado no Éden.Ou a imagem de que Deus é apenas aquela pessoa a quem você recorre porque está no fundo do poço, querendo casa, casamento, sucesso e tantas outras coisas que parecem impossíveis e que alguns promete que Deus vai te dar tudo como se Ele fosse o Papai Noel  Ou a deturpação da imagem de "Javé, o senhor dos exércitos", que move a guerra e o fanatismo contra os infiéis e pecadores; a imagem de Deus Rei também sofre deturpação, levando as pessoas a esquecerem que Deus, mesmo sendo Rei, se faz amigo de seus servos, servido-lhes e convidando-lhes a sentar ao Seu lado, esquecemos que Deus é também fonte da humildade. Às vezes Deus é como uma mãe excessivamente protetora que a toda hora acolhe e alimenta seus filhos, sem fazer com que eles enfrentem a realidade ou percebam a importância de seguir uma regra moral, especialmente se colocando contra a iniqüidade do mundo. Ou a imagem do Deus inerte que permite todas as injustiças acontecerem, sendo injusto por não socorrer ou mesmo permitir que tais calamidades aconteçam com pessoas justas.


O poder está sempre ligado à imagem da divindade e tem sido o elemento que mais leva à deturpação da imagem de Deus, ainda que Ele seja todo poderoso, é preciso perceber que todo seu poder se revela pelo Amor de um Deus humilde, que faz isso por escolha própria e não por uma limitação de seu poder ou liberdade.


Juntamente com a citação do Êxodo eu lembro da citação de Paulo "Agora vemos como em espelho e de maneira confusa; mas depois veremos face a face" (1 Cor 13: 12) - (os espelhos na época de Paulo não eram de vidro, eram de metal polido e refletiam as imagens embaçadas). Outra citação é de João, no Evangelho, em que Cristo diz, "... conhecerão a verdade e a verdade libertará vocês." (João 8:32).


Quando reflito sobre a ordem de Deus para não fazermos para nós mesmo as imagens Dele acho que devemos ter a atenção para deixar que Deus revele sua própria imagem para nós. Como falei, acho inevitável o fato de imaginarmos Deus ou Cristo, ou as histórias da Bíblia. A linguagem de nossa cultura está também presente na Bíblia e nos leva a conceber as imagens a todo momento, não é um problema bíblico, nem da linguagem. - Se há um problema, ele está na maturidade religiosa daquele que imagina, de como essas imagens são organizadas no íntimo do fiel a partir da linguagem e da cultura em que estão inseridos. É para isso que devemos estar atentos.


Voltando à música do começo do texto, acho maravilhoso como os artistas sugerem a beleza de Cristo que não está morto e sim vivo, dono da Fazenda Celeste. E nos convida a tirar Jesus da Cruz para que Ele nos traga muito mais graças para nossas vidas. Embora a imagem de Jesus morto na cruz simbolize sua doação por amor, devemos ter o cuidado para perceber que sua missão não acabou ali, ele ressuscitou e plenificou a mensagem de Amor, provou que aqueles que vivem por amor não terão a morte como fim, pois amor está acima da morte.


A simbologia da cruz é redirecionada por Cristo quando fala da importância de abraçar a cruz, com a intenção de nos chamar à responsabilidade, ao trabalho duro, a não fugir da dor que os desafios contra a iniquidade trará. Abraçá-la para crucificar o nosso egoísmo e permitir que o amor viva em nossos corações. Abraçar a cruz é também entender maduramente o seu significado na vida, de que aquele que busca amar e se faz consciente de que não poderá evitar todas as dores do mundo, especialmente quando lutar contra injustiça dos que tem muito poder ou quando chorar com os que já sofrem.


Outra imagem que me vem à mente é a do menino Jesus que reúne os mais sábios e pastores à sua volta. A beleza de Deus se revela para os humildes e sinceros que O buscam, ao passo que se esconde de pessoas como Herodes, pessoas cegas pelo poder que lançam mão de toda iniquidade dispostos a matar Deus, se for preciso.

Os Sábios Reis Magos são figuras exemplares, mesmo sendo grandes conhecedores cruzam o Oriente para conhecer aquilo que suas mentes não lhes podem revelar, a imagem do Deus vivo. Eles permitem que Jesus os guie até Sua presença através dos sinais, das imagens, dos sonhos. Ao passo que Herodes e seus "sábios" se confundem em tudo pois o poder vale mais para eles. É preciso ter a consciência de deixar que Deus se revele para nós, tendo a maturidade de não nos apressarmos em achar que já sabemos tudo sobre Ele.


Tirar Jesus da cruz significa também abandonar um sentimento de culpa que se propaga pela nossa cultura, ou mesmo, abandonar a crença de que o homem é naturalmente ruim e por isso precisa ser lembrado o tempo todo de que nossos ancestrais mataram com seus pecados o seu próprio Deus. A deturpação da imagem do Cristo na cruz também está ligada à uma cultura do controle pelo medo, levando à resignação e à submissão das próprias vontade e liberdade. Ou ainda representa o fato de que o amor no coração de algumas pessoas está tão frio que Jesus segue morto na cruz dentro delas, que tal sacrifício não bastou para avivar-lhes a fé e a sensibilidade.


 - Enquanto Jesus não for tirado da cruz que há em nossos corações não poderemos provar as deliciosas cocadas de céu e de luz. -

      Agradecimentos a Kézia

Por Túlio Miranda. ( Se gostou, INDIQUE =D )